Read O DIÁRIO DE BRIDGET JONES Online
Authors: Helen Fielding
21h30.
Graças a Deus. Jude e Mark Darcy vieram para a cozinha, me
ajudaram a preparar uma grande omelete, amassaram a batata meio
cozida e fritaram como se fossem batatas coradas. Colocamos o livro
de receitas aberto em cima da mesa para vermos pelas fotos como
seriam as fases de preparo do atum grelhado. Pelo menos o
confit
de laranja vai ficar
bom, está com uma cara ótima. Tom disse que era melhor
a gente não se preocupar com o creme inglês ao Grand
Marnier e beber o licor direto.
22h
.
Estou bem triste.
Fiquei na maior expectativa quando as pessoas deram a primeira
garfada na sobremesa. Houve um silêncio embaraçoso.
—
O
que é isso, meu bem? - Tom acabou perguntando.
—
Geléia?
Apavorada,
provei. Era, como ele disse, pura geléia. Conclui que, depois
de gastar tanto dinheiro, acabei servindo aos meus amigos:
Sopa azul
Omelete
Geléia
Sou
um completo fracasso. Estrela do Guia Michelin de gastronomia? Pareço
mais uma marmiteira.
Pensei
que as coisas não pudessem ficar piores do que estavam, depois
da geléia. Mas, assim que terminamos aquela horrenda refeição,
o telefone tocou. Felizmente, atendi no quarto: era papai.
—
Você
está sozinha? - perguntou.
—
Não,
está todo mundo aqui, Jude e tal. Por quê?
—
É
que gostaria que você estivesse com alguém ... desculpe,
Bridget. As notícias não são muito boas.
—
O
que houve? O quê?
—
A
polícia está procurando sua mãe e Julio.
2h
da manhã
.
Northamptonshire,
cama de solteiro num quartinho da casa dos Alconbmy
.
Argh. Tive de sentar e tomar fôlego enquanto papai ficou
repetindo "Bridget? Bridget? Bridget?" como um papagaio.
—
O
que aconteceu? - consegui perguntar.
—
Os
dois pegaram - acredito e espero, sem o conhecimento de sua mãe
- muito dinheiro de uma porção de gente, inclusive meu
e de alguns amigos nossos. Ainda não sabemos quanto foi mas,
pelo que a polícia disse, sua mãe pode ser condenada a
muitos anos de prisão.
—
Ai,
meu Deus. Foi por isso que ela viajou para Portugal com minhas 200
libras.
—
Ela
agora deve estar bem longe.
Vi
o futuro surgindo como um horrível pesadelo: Richard Finch me
chamando de De Repente, Filha de Detenta
do
Boa Tarde!
, e me
obrigando a fazer uma entrevista ao vivo da sala de visitas do
Presídio Holloway antes de ser De Repente, Demitida ao vivo.
—
O
que eles fizeram?
—
Parece
que Julio usou sua mãe como testa-de-ferro, digamos assim,
para pegar muito dinheiro de Una e Geoffrey, Nigel e Elizabeth,
Malcolm e Elaine (ai, Deus, os pais de Mark Darcy). Muito, mas muito
dinheiro para dar como entrada em apartamentos num condomínio
—
Você
não sabia que seus amigos estavam metidos nisso?
—
Não.
Acho que não me disseram nada porque ficaram sem graça
de fazer negócio com aquele cafajeste gomalinado que corneou
um dos mais antigos amigos deles.
—
E
o que aconteceu?
—
Os
apartamentos nunca existiram. A poupança da sua mãe
acabou, além da minha aposentaria. Foi bobagem minha colocar a
casa no nome dela, sua mãe penhorou. Bridget, estamos falidos,
sem recursos, sem casa e com sua mãe prestes a ser condenada
como criminosa.
Depois
de dizer isso, ele não agüentou. Una veio ao telefone e
disse que ia dar um pouco de Ovomaltine para papai. Falei que
chegaria lá dentro de duas horas mas ela falou para eu só
dirigir depois de me recuperar do choque, pois não se podia
fazer nada, melhor ir na manhã seguinte.
Desliguei
o telefone e bati com a cabeça na parede, me xingando por ter
largado os cigarros na sala. Mas Jude apareceu com um copo de Grand
Marnier.
—
O
que foi? - perguntou ela.
Contei
tudo, bebendo o Grand Marnier de um gole. Jude não disse uma
palavra e foi procurar Mark Darcy.
—
Sinto-me
culpado - confessou ele, passando a mão no cabelo.
—
Devia ter sido mais claro naquela festa dos Vigários e
Vagabundas. Eu sabia que Julio tinha alguma coisa estranha.
—
Como
assim?
—
Ouvi
quando falou no celular perto dos canteiros do jardim. Ele não
sabia que eu estava ouvindo. Se eu soubesse que meus pais também
estavam envolvidos, eu... - ele balançou a cabeça.
—
Agora lembro de minha mãe dizendo alguma coisa, mas fiquei tão
distraído com a simples menção da palavra
condomínio que devo ter mandado ela ficar quieta. Onde sua mãe
está agora?
—
Não
sei. Em Portugal? No Rio de Janeiro? No cabeleireiro?
Ele
começou a andar de um lado para outro na sala, fazendo
perguntas como um grande advogado.
—
O
que está sendo feito para encontrá-la? Qual é a
quantia envolvida? Como descobriram a fraude? O que a polícia
sabe? Quem mais tem conhecimento do caso? Onde está seu pai?
Você gostaria de falar com ele? Você permite que eu vá
junto? - foi uma cena muito
sexy
,
juro.
Jude
apareceu trazendo café. Mark resolveu que era melhor achar o
motorista dele para nos levar ate Grafton Underwood e, por um
segundo, tive a sensação completamente inusitada de ser
grata à mamãe.
Foi tudo muito
dramático quando chegamos na casa de Una e Geoffrey: tinha
Enderby e Alconbury chorando por todo canto e Mark Darcy telefonava
sem parar. Fiquei me sentindo culpada, pois uma parte de mim estava -
apesar do medo - adorando não ter de ir trabalhar e viver uma
situação totalmente diferente do cotidiano, com todo
mundo podendo beber vários copos de xerez e comer sanduíches
de salmão como se fosse Natal. Foi a mesma sensação
que tive quando vovó ficou maluca e, depois de tirar toda a
roupa, correu para o pomar de Penny Husbands-Bosworth e precisou ser
contida pela polícia.
QUARTA-FEIRA,
22 DE NOVEMBRO
55,
6kg (viva!), 3 unidades alcoólicas, 27 cigarros (muito
compreensível, já que minha mãe está
sendo considerada uma criminosa), 5.671 calorias (ai, Deus, parece
que meu apetite voltou), 7 bilhetes de loteria (esse foi um ato de
desprendimento, tentando recuperar o dinheiro de todo mundo. Mas
cheguei à conclusão de que, se ganhasse, não ia
dar tudo para eles), 10 libras gastas, 3 libras de lucro (preciso
começar a partir de alguma coisa).
10h.
Cheguei em casa, exausta por não ter dormido. Para completar,
tenho de ir trabalhar e ainda vou levar bronca por estar atrasada.
Quando vim embora, papai parecia estar melhorando: numa hora
mostrava-se muito satisfeito porque Julio tinha provado que era um
salafrário e assim mamãe poderia voltar para casa e
começar vida nova. Outra hora caía em profunda
depressão, achando que a dita vida nova ia consistir em
visitas à prisão, aonde chegaria de ônibus.
Mark
Darcy voltou para Londres de madrugada. Deixei um recado na
secretária eletrônica dele agradecendo a ajuda e tal,
mas ele não ligou de volta. Não posso culpá-lo.
Aposto que Natasha e todas as outras mulheres que ele conhece não
servem sopa azulada para ele nem viraram filhas de criminosa.
Una
e Geoffrey disseram para não me preocupar com papai, pois
Brian e Mavis vão ficar e ajudar a cuidar dele. Fiquei
pensando em por que sempre falam Una e Geoffrey e não Geoffrey
e Una, mas dizem Malcolm e Elaine e Brian e Mavis. Por outro lado,
dizem Nigel e Audrey Coles. Do mesmo jeito que nunca se diz Geoffrey
e Una, jamais se diria Elaine e Malcolm. Por quê? Por quê?
Sem querer, fico pensando em Sharon e Jude daqui a muitos anos,
chateando as filhas, dizendo: "Você conhece Bridget e
Mark
,
querida, que moram naquela casa enorme em Holland Park e sempre
passam as férias no Caribe." Isso mesmo. Seria Bridget e
Mark. Bridget e Mark Darcy. Os Darcy.
E
não Mark e Bridget Darcy, pelo amor de Deus: horrível.
De repente, me sinto mal por estar pensando em Mark Darcy nesse
contexto, como se fosse a governanta Maria com o Capitão Von
Trapp no filme
A noviça
rebelde
e precisasse
fugir para conversar com a Madre Superiora que vai cantar
Climb
Every Mountain
para
mim.
SEXTA-FEIRA,
24 DE NOVEMBRO
56,7kg,
4 unidades alcoólicas (mas tomadas na presença da
policia, por isso, nada a declarar), 0 cigarro, 1.760 calorias, 11
ligações para o 1471 para saber se Mark tinha me
ligado
22h30.
As coisas estão indo de mal a pior. Achei que o único
lado positivo do processo contra mamãe tinha sido fazer com
que Mark Darcy e eu nos aproximássemos, mas não soube
mais dele, desde que saiu da casa dos Alconbmy. A polícia
acaba de vir ao apartamento pegar meu depoimento. Comecei a me
comportar como as pessoas que são entrevistadas na televisão
quando um avião cai no jardim delas, usando aqueles chavões
de telejornais, de filmes passados em tribunais e que tais. Acabei
descrevendo minha mãe como tendo "estatura mediana"
e "tez clara".
Os policiais eram
muito interessantes e tranqüilizadores. Ficaram até tarde
e um dos detetives disse que ia aparecer de novo no meu apartamento
para ver como estavam as coisas. Simpático mesmo, adorei.
SÁBADO,
25 DE NOVEMBRO
57kg,
2 unidades alcoólicas (xerez, argh!), 3 cigarros (fumados na
janela da casa dos Alconbury), 4.567 calorias (só de biscoitos
recheados e sanduíches de salmão), 9 ligações
para o 1471 para saber se Mark Darcy tinha ligado.
Graças
a Deus. Mamãe ligou para papai. Parece que disse para ninguém
se preocupar, ela estava bem, tudo ia bem, depois desligou de
repente. A polícia estava na casa de Una e Geoffrey
interceptando a linha, como no filme Thelma e Louise, e disseram que
ela estava mesmo em Portugal, mas não conseguiram localizar a
cidade. Gostaria tanto que Mark Darcy ligasse.
Claro
que ele deve ter ficado assustado com meus desastres culinários
e por haver uma criminosa na minha família, mas era muito
educado para demonstrar isso. Claro também que o fato de
termos tido uma piscininha de plástico em comum na infância
não significa nada depois do roubo das economias dos pais dele
pela vexaminosa mãe da malcriada Bridget. Vou encontrar papai
hoje à tarde como uma solteirona desprezada por todos os
homens e não do jeito que já tinha me acostumado: ao
lado de um grande advogado, dentro de um carro com motorista.
13h.
Viva! Viva! Na hora em que ia sair de casa, o telefone tocou, mas eu
só conseguia ouvir um ruído. Depois, tocou de novo. Era
Mark, falando de Portugal. Que gentileza e que sagacidade. Ele passou
a semana inteira em contato com a polícia, além de
continuar mantendo seu escritório de grande advogado e ter ido
para Albufeira ontem. A polícia local encontrou mamãe;
Mark acha que ela vai ser inocentada porque está bem evidente
que ignorava o que Julio estava fazendo. A polícia conseguiu
recuperar parte do dinheiro, mas ainda não encontrou Julio.
Mamãe volta
hoje à noite e terá de ir direto à delegacia
para ser interrogada. Mark disse para eu não me preocupar,
tudo vai acabar bem e ele já está vendo se vai ser
preciso pagar fiança. Desligamos, sem dar tempo nem para eu
agradecer. Fiquei louca para falar com Tom e contar as maravilhosas
notícias, mas lembrei que não era para ninguém
saber do problema de mamãe e, infelizmente, na última
vez que falei de Mark Darcy para Tom, acho que disse que ele é
um horrível filhinho de mamãe.